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Caminhos e conexidade

Um caminho4 num grafo $ G$ é uma sucessão de vértices e arestas

ALT=

com $ v_i\in V_G$, tais que ALT=. Ou seja, ALT=. Num digrafo, as arestas são tais que $ x_i=(v_{i-1},v_i)$, ou seja, a extremidade inicial de $ x_i$ é $ v_{i-1}$ e a final é $ v_i$.

Visto não considerarmos multigrafos, esse caminho é denotado por $ ( v_0,v_1,v_2, \dots, v_n)$, ou mais simplesmente

ALT=

e dizemos que existe um caminho ALT=. Neste caso, $ v_n$ é alcançável de $ v_0$. Um caminho diz-se trivial se só tiver um vértice, sem lacete.

Definições análogas podem ser dadas para digrafos.

Um caminho é

Note-se com um caminho elementar é simples, mas que o contrário é falso.

Um ciclo7 é um caminho fechado elementar não trivial. Um circuito8 é um caminho fechado simples não trivial.

Recuperamos um grafo que apresentámos atrás:

$\displaystyle \xymatrix{
& u \ar@{-}[ld] \ar@{-}[ldd]\ar@{-}[rdd] \ar@{-}[rd] & \\
y \ar@{-}[d] \ar@{-}[rrd] && v\ar@{-}[d]\ar@{-}[lld]\\
x \ar@{-}[rr] && w}$

Um caminho ALT= é, por exemplo, ALT=. Repare que este caminho repete um vértice mas não repete nenhuma aresta. Portanto, é um caminho simples que não é elementar. Já $ xvux$ é um ciclo e $ xvuxywx$ é um circuito.

Um grafo que é um ciclo com $ n$ vértices denota-se por ALT=, e um grafo que é um caminho elementar com $ n$ vértices denota-se por $ P_n$. ALT= é usualmente denominado triângulo.

ALT= $ \xymatrix{
\bullet \ar@{-}[d] \ar@{-}[r] & \bullet\\
\bullet \ar@{-}[ru]}$ $ \xymatrix{
\bullet \ar@{-}[d] \ar@{-}[r] & \bullet\\
\bullet \ar@{-}[r] & \bullet\ar@{-}[u]}$
ALT= ALT= $ C_4$

ALT= ALT= ALT=
$ P_2$ $ P_3$ ALT=

Um grafo é conexo se, para quaisquer vértices $ v_i,v_j$ distintos, existe um caminho $ v_i - v_j$. Portanto, um grafo é conexo se quaisquer dois vértices forem alcançáveis um do outro.

Dado um grafo $ {\cal{G}}$, podemos definir a seguinte relação em $ {\cal{V}}_{\cal{G}}$, que é de equivalência:

$\displaystyle v_i \rho v_j$    se existe um caminho $\displaystyle v_i - v_j.$

As componentes conexas (ou simplesmente componentes) são os subgrafos induzidos pelas classes de equivalência. Ou seja, uma componente conexa é um subgrafo maximal conexo de $ G$.

O comprimento $ \ell (\gamma) $ de um caminho $ \gamma$ é o número de arestas desse caminho. Denota-se por $ \Gamma_{i,j}^k$ o conjunto de todos os caminhos de comprimento $ k$ do vértice $ V_i$ para o vértice $ V_j$, e por $ \Gamma_{uv}$ o conjunto de todos os caminhos ALT=. Se $ \gamma=(v_0,v_1,\dots,v_n)$ contiver um caminho fechado $ \omega=(v_k,\dots,v_k)$, uma redução $ \phi$ do caminho $ \gamma$, $ \gamma-\omega$, é o caminho obtido de $ \gamma$ a que se retirou todas as arestas e vértices de $ \omega$ à excepção de $ v_k$. De forma recíproca, a concatenação de dois caminhos $ \gamma=(v_0,v_1,\dots, v_k),\omega=(v_k,v_{k+1},\dots,v_n)$ é o caminho $ \gamma \circ \omega=(v_0,v_1,\dots, v_k,v_k,v_{k+1},\dots,v_n)$.

Proposição 5.1   Todo o caminho não fechado $ \gamma$ contém um caminho elementar.

Se $ \gamma$ é caminho elementar, então não há nada a provar. Suponhamos então que $ \gamma$ não é um caminho elementar. Ou seja, existe um vértice $ v_k$ repetido em $ \gamma$,

$\displaystyle \gamma=v_0v_1\cdots v_{i-1}v_k v_{i+1}\cdots v_{j-1}v_k v_{j+1}\cdots v_N.$

Sejam $ \omega=v_k v_{i+1}\cdots v_{j-1}v_k$ e $ \gamma '=\gamma - \omega$. Se $ \gamma$ é um camminho elementar, então a prova está concluída; caso contrário, repete-se o processo até se obter um caminho elementar.

A distância $ d(u,v)$ entre os vértices $ u$ e $ v$ distintos é o comprimento do menor caminho elementar que os une; caso não exista um tal caminho, $ d(u,v)=\infty$. Assume-se que $ d(u,u)=0$. Note-se que:

  1. $ d(u,v)\ge 0$ e $ d(u,v)=0 \Leftrightarrow u=v$;
  2. $ d(u,v)=d(v,u)$;
  3. $ d(u,w)\le d(u,v)+d(v,w)$.
Uma geodésica entre $ u$ e $ v$ é um caminho elementar minimal ALT=. O diâmetro $ d(G)$ de um grafo conexo $ G$ é o comprimento da maior geodésica.

Proposição 5.2   Um $ n$-grafo $ {\cal{G}}$, com $ n\ge 2$, é bipartido se e só se não tiver ciclos de comprimento ímpar.

Suponhamos que no grafo bipartido $ {\cal{G}}$ (sendo $ \{V_1,V_2\}$ a partição do conjunto dos vértices de $ {\cal{G}}$ na definição de grafo bipartido) existe um ciclo $ \gamma=v_0\cdots v_nv_0$ tal que $ \ell (\gamma) $ é ímpar, ou seja, que tem um número ímpar de arestas. Ou seja, o ciclo tem um número ímpar de vértices, já que é um caminho fechado e nenhum vértice surge repetido. Então $ v_0, v_n \in V_1 $ ou em alternativa $ v_0,v_n \in V_2$. Se $ v_n \in V_1 $ e como $ \{v_n,v_0 \}$ é aresta de $ \gamma$, segue que $ v_0 \in V_2$ e portanto $ v_0 \in V_1 \cap V_2 = \emptyset$. O caso $ v_n \in V_2 $ é análogo.

Suponhamos agora que $ {\cal{G}}$ é um $ n$-grafo, com $ n\ge 2$, sem ciclos de comprimento ímpar. Sem perda de generalidade, assume-se com $ {\cal{G}}$ é conexo. Fixemos $ u \in V_{\cal{G}}$ e definamos os conjuntos $ V_1=\{v\in V_{\cal{G}}: d(u,v)$    é par$ \}$ e $ V_2=\{v\in V_{\cal{G}}: d(u,v)$    é Ãmpar$ \}$. Como é óbvio, $ \{V_1,V_2\}$ é uma partição de $ V_{\cal{G}}$. Resta-nos mostrar que vértices no mesmo elemento da partição não são vizinhos. Por absurdo, vamos supor que existe $ e=\{w,v\}$ com $ w,v\in V_1$ (o caso de ambos pertencerem a $ V_2$ é análogo). Sendo o grafo conexo, então ALT= e $ u-w$. Sejam $ \gamma_v,\gamma_w$ as geodésicas entre $ u$ e $ v$ e entre $ u$ e $ w$, respectivamente. Então existe o vértice $ P$, comum aos dois caminhos e que torna a secção $ u\cdots P$ de comprimento máximo. Ou seja, $ P$ é o último vértice comum às duas geodésicas, e portanto as secções $ u\cdots P$ de $ \gamma_1$ e $ u\cdots P$ de $ \gamma_2$ têm o mesmo comprimento. Como $ w,v\in V_1$ então tem igual paridade o comprimento das secções $ P\cdots v$ e $ P\cdots w$. Se forem pares, então a concatenação dos caminhos $ \gamma_1,e,\gamma_2$ define um ciclo de comprimento ímpar. O mesmo se conclui se os comprimentos forem ímpares, o que contradiz a hipótese do grafo não ter ciclos ímpares.

O grafo seguinte não contém ciclos de comprimento ímpar

$\displaystyle \xymatrix{
& \bullet \ar@{-}[r]\ar@{-}[rdd] & \bullet \ar@{-}[rd]...
...-}[ru]\ar@{-}[rd] & & & \bullet\ar@{-}[ld]\\
& \bullet\ar@{-}[r] & \bullet & }$

pelo que é bipartido. Como exercício, descreva os ciclos e encontre a partição do conjunto dos vértices.

Proposição 5.3   Todo o circuito contém um ciclo.

Seja $ \omega$ um circuito num grafo $ {\cal{G}}$. Se $ \omega$ é ciclo então não há nada a provar. Se não é, então existem dois vértices $ v_0,v_k$ repetidos. Ou seja, existe uma secção $ \phi$ do circuito $ \omega$ que é um caminho fechado. Como $ \omega$ não tem arestas repetidas, então $ \phi$ é um circuito. Se $ \phi$ é ciclo, então a prova está terminada. Se não, então repete-se o processo até se obter um ciclo.

Vejamos agora como se pode mostrar o não isomorfismo de grafos à custa da noção de conexidade que temos estudado nesta secção.

Teorema 5.4   Supondo $ {\cal{G}}\cong_\varphi {\cal{H}}$,
  1. se $ \gamma=v_0v_1\cdots v_k$ é um caminho de comprimento $ r$ de $ {\cal{G}}$ então $ \varphi(\gamma)=\varphi(v_0)\varphi(v_1)\cdots \varphi(v_k)$ é um caminho de comprimento $ r$ de $ {\cal{H}}$.
  2. a imagem por $ \varphi$ de um caminho simples [resp. caminho elementar, ciclo] é um caminho simples [resp. caminho elementar, ciclo] com o mesmo comprimento.
  3. $ {\cal{G}}$ e $ {\cal{H}}$ têm o mesmo número de componentes conexas.

Exercício.

Como aplicação do resultado anterior, os grafos seguintes não são isomorfos:

$ \xymatrix{
& \bullet \ar@{-}[r]\ar@{-}[rdd] & \bullet \ar@{-}[rd] &\\
\bullet...
...-}[ru]\ar@{-}[rd] & & & \bullet\ar@{-}[ld]\\
& \bullet\ar@{-}[r] & \bullet & }$ $ \xymatrix{
& \bullet \ar@{-}[r]\ar@{-}[dd] & \bullet \ar@{-}[rd] &\\
\bullet\...
...-}[ru]\ar@{-}[rd] & & & \bullet\ar@{-}[ld]\\
& \bullet\ar@{-}[r] & \bullet & }$
$ {\cal{G}}$ $ {\cal{H}}$
De facto, $ {\cal{H}}$ contém um ciclo ALT= o que não sucede com $ {\cal{G}}$.

No resultado seguinte, faz-se uso da noção de matriz de adjacência definida atrás para se estudar não só a alcançabilidade mas também o comprimento dos caminhos possíveis entre dois vértices.

Proposição 5.5   Seja $ A$ a matriz de adjacência do grafo $ {\cal{G}}$, para uma ordenação fixa previamente dos vértices. A entrada $ A_{[u,v]}^r$ indica o número de caminhos ALT= de comprimento $ r$.

Um grafo simples diz-se acÃclico se não tiver ciclos.

Uma árvore9 é um grafo acíclico conexo.

Um grafo acíclico chama-se floresta10. Logo, as componentes conexas de uma floresta são árvores.

Lema 5.6   Numa árvore com pelo menos uma aresta existem pelo menos dois vértices com grau 1.

Seja $ N$ o diâmetro do grafo e seja $ \gamma=v_0v_1v_2\cdots v_N$ uma geodésica cujo comprimento é $ N$, e suponhamos que $ v_0$ tem grau maior que 1. Então $ v_0$ é vizinho não só de $ v_1$ mas também de outro vértice $ w$. Se $ w$ é vértice de $ \gamma$ então $ \gamma$ teria um ciclo. Se $ w$ não é vértice de $ \gamma$ então $ \gamma'=wv_0\circ\gamma$ seria um caminho elementar de comprimento $ N+1$, o que contraria a noção de diâmetro. O mesmo raciocícnio se aplica a $ v_N$.

Teorema 5.7   Para $ {\cal{G}}$ um grafo $ (p,q)$, as afirmações seguintes são equivalentes:
  1. $ {\cal{G}}$ é uma árvore;
  2. Todos os vértices de $ G$ são ligados por um único caminho elementar;
  3. $ G$ é conexo e $ p=q+1$;
  4. $ G$ é acíclico e $ p=q+1$.

$ (1) \Leftrightarrow (2)$. Se $ {\cal{G}}$ é uma árvore, então é um grafo acíclo conexo. Existe um caminho $ v_i - v_j$, e esse caminho contém um caminho elementar. A concatenação de dois caminhos elementares distintos daria origem a um ciclo, o que mostra a unicidade. Reciprocamente, a existência de um caminho elementar garante a conexidade do grafo. A unicidade impede a existência de ciclos (verifique a razão).

$ (1) \Rightarrow (3)$. A conexidade é imediata. Considere a propriedade $ P(n):$ uma árvore $ {\cal{G}}$ com $ n$ vértices tem $ n-1$ arestas, onde $ n\ge 2$. $ P(2)$ é válida. Mostre-se que $ P(n)$ é suficiente para $ P(n+1)$. Seja $ {\cal{G}}$ uma árvore com $ n+1 $ vértices, e seja $ v_{n+1}$ um vértice escolhido de tal forma que $ deg(v_{n+1})=1$. Seja ainda $ {\cal{G}}'={\cal{G}}-v_{n+1}$. Temos que $ {\cal{G}}'$ tem $ n$ vértices, e que é uma árvore (verifique!), e portanto tem $ n-1$ arestas. Logo $ {\cal{G}}$ tem $ n$ arestas.

$ (1)\Rightarrow (4)$ é análogo.

$ (4)\Rightarrow (3)$. Se $ {\cal{G}}$ é acíclico, então é uma floretsa com $ k$ componetes conexas $ {\cal{G}}_1,{\cal{G}}_2,\dots,{\cal{G}}_k$ que são árvores. Logo, aplicando $ (1) \Rightarrow (3)$ a cada uma destas componentes, obtemos $ p-k$ arestas em $ {\cal{G}}$, pelo que, e sabendo que $ {\cal{G}}$ tem $ q$ arestas e $ p-1=q$, se conclui que $ k=1$, ou seja $ {\cal{G}}$ é conexo.

$ (4)\Rightarrow (2)$. Suponha que (4) é válida, mas que (2) é falsa. Ou seja, ou que existem dois caminhos elemenatares entre dois vértices, ou que não existe caminho elementar algum. O primeiro caso implica a existência de um ciclo, o segundo a não conexidade do grafo.

Finalmente, dizemos que uma aresta de $ {\cal{G}}$ é uma ponte se a eliminação dessa aresta aumenta o número de componentes do grafo. â imediato verificar-se que todas as arestas de uma árvore são pontes. De facto, se $ {\cal{G}}$ é uma árvore e $ v,w$ são vértices tais que $ \{v,w\}$ não é ponte, então existe $ \gamma$ caminho $ v-w$ que não contenha a aresta $ \{v,w\}$. Ora a inclusão da aresta $ \{v,w\}$ cria um caminho fechado, e portanto a existência de um ciclo.


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Pedro Patricio 2006-05-29