Nesta secção, vamo-nos debruçar sobre dois problemas, que aliás, e como veremos, estão relacionados. Assume-se que é uma matriz sobre . Essas questões são:
Recordamos a noção de semelhança entre matrizes. As matriz e dizem-se semelhantes, e denota-se por , se existir uma matriz invertível para a qual . Repare que as matrizes são necessariamente quadradas.
É óbvio que se então ; de facto, se então .
É óbvio que uma matriz diagonal é diagonalizável, bastando tomar a matriz identidade como matriz diagonalizante.
O resultado seguinte não só nos caracteriza as matrizes diagonalizáveis, mas também, à custa da sua prova, obtemos um algoritmo para encontrar a matriz diagonal e a a respectiva matriz diagonalizante.
Em primeiro lugar, assumimos que é diagonalizável; ou seja, existe uma matriz invertível tal que .
Como é óbvio, de
segue que . Portanto,
Reciprocamente, suponha que tem vectores próprios linearmente independentes. Sejam eles os vectores , associados aos valores próprios (não necessariamente distintos) . Seja a matriz cujas colunas são os vectores próprios considerados acima. Ou seja, . Ora esta matriz quadrada tem característica igual a , pelo que é invertível. De
Realçamos o facto da demonstração do teorema nos apresentar um algoritmo de diagonalização de uma matriz com vectores linearmente independentes. De facto, de obtemos
Para a matriz , vimos atrás que . Será diagonalizável? Um vector próprio associado ao valor próprio é um elemento não nulo de . Encontrar um vector próprio associado a é equivalente a encontrar uma solução não nula de . Fica ao cargo do leitor verificar que é vector próprio associado ao valor próprio , e fazendo o mesmo raciocínio, que é vector próprio associado ao valor próprio 2. Ora estes dois vectores são linearmente independentes, visto . Portanto, a matriz é diagonalizável, sendo a matriz diagonalizante e a matriz diagonal .
Octave
A diagonalização, se possível, pode ser obtida de forma imediata como Octave:
> [q,e]=eig (A) q = -0.44721 -0.89443 0.89443 -0.44721 e = -3 0 0 2Aqui, a matriz q, ou seja, o primeiro argumento de saída de eig, indica uma matriz diagonalizante, e o segundo argumento, i.e., e, indica a matriz diagonal cujas entradas diagonais são os valores próprios. Repare, ainda, que a coluna de q é um vector próprio associado ao valor próprio que está na entrada de e. Façamos, então, a verificação:
> q*e*inverse (q) ans = 1.0000 2.0000 2.0000 -2.0000
Considere agora a matriz . Esta matriz é nilpotente, pelo que . O espaço próprio associado a 0 é . Ora , pelo que , e portanto a multiplicidade geométrica do valor próprio 0 é 1 (repare que a multiplicidade algébrica do valor próprio 0 é 2). Ou seja, não é possível encontrar 2 vectores próprios linearmente independentes.
Octave
Considere a matriz C=[2 1; 0 2]. Sendo triangular superior, os seus valores próprios são os elementos diagonais da matriz. Isto é,
. Repare que a multiplicidade algébrica do valor próprio é 2.
> eig (C) ans = 2 2Repare que , pelo que . Logo, não é possível encontrar 2 vectores próprios de linearmente independentes, e portanto não é diagonalizável.
> rank(2*eye(2)-C) ans = 1 > [q,e]=eig (C) q = 1 NaN 0 NaN e = 2 0 0 2É, todavia, apresentada uma base do espaço próprio de associado ao valor próprio 2, nomeadamente a primeira coluna da matriz q.
Considere agora a matriz
.
Octave
Para A=[1 2 1;2 -2 2; 0 0 -3] tem-se
, sendo as multiplicidades algébricas de e , respectivamente, 2 e 1.
> eig (A) ans = 2 -3 -3Como , temos que , e portanto a multiplicidade geométrica do valor próprio é 1. Portanto, a matriz não é diagonalizável pois não é possível encontrar 3 vectores próprios linearmente independentes.
> [q,e]=eig (A) q = 0.89443 -0.44721 NaN 0.44721 0.89443 NaN 0.00000 0.00000 NaN e = 2 0 0 0 -3 0 0 0 -3A primeira coluna de q é um vector próprio associado a 2 e a segunda coluna de q é um vector próprio associado a
O que se pode dizer em relação à independência linear de um vector próprio associado a e um vector próprio associado a ?
Seja o menor inteiro para o qual o conjunto é linearmente independente. Ora já que (pois é é vector próprio) e já que o conjunto dos vectores próprios é linearmente dependente. Sendo o conjunto linearmente dependente, existem escalares não todos nulos para os quais
Alertamos para o facto do recíproco do teorema ser falso. Repare que a matriz identidade tem como único valor próprio, e a dimensão de ser , e portanto há vectores próprios linearmente independentes associados a .
Se uma matriz tem os seus valores próprios distintos então, pelo teorema, tem vectores próprios linearmente independentes, o que é equivalente a afirmar que a matriz é diagonalizável.
Mais uma vez alertamos para o facto do recíproco do corolário ser falso. Isto é, há matrizes diagonalizáveis que têm valores próprios com multiplicidade algébrica superior a 1.
Octave
Considere a matriz A=[0 0 -2; 1 2 1; 1 0 3]. Esta matriz tem dois valores próprios distintos.
> A=[0 0 -2; 1 2 1; 1 0 3]; > eig(A) ans = 2 1 2Repare que o valor próprio 2 tem multiplicidade algébrica igual a 2, enquanto que a multiplicidade algébrica do valor próprio 1 é 1. Pelo teorema anterior, um vector próprio associado a 2 e um vector próprio associado a 1 são linearmente independentes. Repare que a multiplicidade geométrica de é também 2, calculando rank(2*eye(3)-A).
> rank(2*eye(3)-A) ans = 1Como a característica de é 1 então , e portanto existem dois vectores próprios linearmente independentes associados a . Uma base do espaço próprio associado a 2 pode ser obtida assim:
> null(2*eye(3)-A) ans = -0.70711 0.00000 0.00000 1.00000 0.70711 0.00000Estes juntamente com um vector próprio associado ao valor próprio 1 formam um conjunto linearmente independente, pois vectores próprios associados a valor próprios distintos são linearmente independentes. Ou seja, há 3 vectores próprios linearmente independentes, donde segue que a matriz é diagonalizável.
> [v,e]=eig (A) v = 0.00000 -0.81650 0.70656 1.00000 0.40825 0.03950 0.00000 0.40825 -0.70656 e = 2 0 0 0 1 0 0 0 2 > v*e*inverse(v) ans = -0.00000 0.00000 -2.00000 1.00000 2.00000 1.00000 1.00000 0.00000 3.00000